Uma das palavras da moda nos últimos anos com certeza é parcialidade (e seu antônimo imparcialidade). Segundo definições de Oxford, parcialidade é:
1) qualidade de quem ou do que é parcial; parcialismo.
2) grupo partidário de uma mesma causa; partido, facção.
Entende-se, portanto, que é parcial aquele que defende uma causa em seus argumentos, posicionamentos, falas etc., e consequentemente que imparcial é quem foge de qualquer opinião própria ou de outrem para transmitir uma mensagem. Vemos esse debate incessantemente no jornalismo, onde é cada vez mais comum acusações de determinado veículo ser ou não imparcial. Aqui, o “ideal” seria a imparcialidade perfeita, afinal, o objetivo dos veículos de comunicação é apenas transmitir uma notícia, e quando desejado, expor a opinião em segmentos próprios para isso, onde o leitor, ouvinte ou telespectador saiba que está diante de uma opinião.
O problema aqui é simples: como os seres humanos, inerentemente dotados de opiniões, sensações, sentimentos etc. serão capazes de transmitir qualquer mensagem de forma puramente imparcial?
Não faz sentido buscar essa imparcialidade perfeita de indivíduos que nunca serão perfeitos. Contudo, podemos e devemos buscar o mais próximo disso. Explico.
Se a busca pela racionalidade livre de ideologia deixar de existir, corremos sérios riscos de que malucos extremistas e irracionais tomem o lugar de pessoas competentes em seus trabalhos.
Não há dúvida que os supostos jornalistas, escritores ou qualquer profissão que eles dizem deter que fazem parte do grupo mais extremo da sociedade não buscam NUNCA a imparcialidade. Por mais que eles insistam em dizer que “aqui se diz a verdade, sem manipulação” ou qualquer discurso vazio e mentiroso como esse, é muito fácil perceber que não é o caso. Portanto, se deixarmos a ideia de que não existe imparcialidade perfeita predominar em nossas mentes e discussões, corremos o risco de pessoas como essas, que claramente não tem o menor interesse em separar suas ideologias perigosas de como eles se comunicam, tomarem uma voz tão grande na sociedade que seremos de fato incapazes de separar os que buscam a seriedade e os que buscam apenas o controle social.
A ideia de separar ideologias e interesses de conclusões ou mensagens objetivas não é exclusiva do jornalismo. Sabemos, por exemplo, que a indústria do açúcar pagou cientistas para elaborarem estudos que culpassem a gordura pelos problemas trazidos pelo açúcar. Ora, se afirmarmos, então, que é impossível separar interesses e ideologias de conclusões ou mensagens, e que, portanto, não devemos buscar essa separação, estaremos aceitando que tentativas de controle ou manipulação da sociedade são normais e aceitáveis, afinal, ninguém é perfeito. O problema aqui é que há, na maioria das vezes, pessoas seríssimas buscando separar o máximo possível suas ideologias de seus trabalhos, e por isso precisamos sempre diferenciar essas pessoas daquelas que só tem o seu próprio interesse em mente.
Entendo as contradições que possam surgir. Se não existe imparcialidade perfeita e precisamos entender isso antes de criticar alguém por não possuí-la, por que devemos buscar sempre o mais próximo dela? Para responder à pergunta, podemos imaginar o seguinte: todos sabemos que é impossível atingir a perfeição em qualquer área da vida, todos e tudo tem limitações, mas se nunca buscarmos chegar o mais perto possível dela, estaremos nós mesmos nos limitando, limitando nossos alcances, nossas habilidades e principalmente nosso crescimento. Além disso, corremos o risco de colocar na mesma prateleira indivíduos que causam mal a sociedade e indivíduos que buscam melhora-la constantemente.
Talvez uma das melhores maneiras de atingir o mais próximo possível da imparcialidade seja aprendendo com a Wikipedia. Segundo determina a Enciclopédia mais famosa do mundo, todo o conteúdo escrito no site deve ser feito através de um ponto de vista neutro, o que significa representar justamente, proporcionalmente, e o mais longe possível de qualquer tendência editorial todas as visões significantes que tenham sido publicadas por fontes confiáveis em determinado tópico. Veja que o interesse não é “dar a opinião correta” ou ainda falar o que é aceito, mas sim expor todas as opiniões e visões sobre um assunto sem inferir direta ou indiretamente qual o autor do texto tem mais afinidade.
É claro que tudo escrito no site terá o mínimo possível de parcialidade, afinal são humanos escrevendo sobre atos de outros humanos, e tudo é revisado por outros humanos. Se nenhum humano é perfeito então é impossível que seus atos sejam. Contudo, a busca incessante pela maior neutralidade possível deve ser louvada e praticada, afinal, o objetivo é transmitir uma mensagem direta, sem influenciar. Fazendo isso também conseguimos diferenciar sites sérios como a Wiki de sites, fóruns ou comunidades cujo único objetivo é manipular seus leitores em acreditarem que aquilo que eles comunicam é livre de fortes tendências e opiniões.
Inspirado em: If You Can Be Bad, You Can Also Be Good.
Obs.: o texto foi escrito originalmente por mim em maio de 2021. Você pode encontrar a publicação aqui. Não houve alterações nessa versão aqui exposta.